24 de jun. de 2010

All I really want is you.

A garota de vinte e poucos anos cantava em cima do palco. Fechava os olhos na parte que a empolgava mais. Tinha um talento único para a música, todos sabiam. Era ela sempre que subia ao palco para deslumbrar a platéia. Hoje, porém, quem iria deslumbrar seria ele. Poucos sabiam do seu talento para a música. Apenas alguns amigos sabiam que cantara quando criança em festivais e na adolescência tivera uma banda. Mas não se importava com o que os outros pensariam. Cantaria para alguém especial. "You're everything I need and more. It's written all over your face.Baby I can feel your halo. Pray it won't fade away. I can feel your halo halo halo.I can see your halo halo halo. I can feel your halo halo halo. I can see your halo halo halo". Juliana terminara, ouvindo os aplausos de todos que ali estavam. Interropendo aquele que chamava o próximo cantor, anunciou que iria cantar uma canção. Subiu as escadas que davam para o centro do palco e pediu à banda a música que queria. "Essa canção é para alguém especial", disse, balançando a cabeça positivamente em direção a banda, que logo começou a tocar música. "Oh, this is the start of something good. Don't you agree? I haven't felt like this in so many moons. You know what I mean?" Segurou o microfone e o som da sua voz saia maravilhosamente para quem o ouvia. Fechou os olhos, de repente, lembrando de como a conhecera. Era inverno, estava no primeiro ano da faculdade e começara a trabalhar como auxiliar de escritório de advocacia. Ela entrara de vestido preto justo, cabelos soltos, longos e negros que contrasteava sua pele branca como a neve. Pousou imediatamente os olhos nela. Esta não o notou. Demorou apenas alguns dias para vê-la de novo. "And we can build through this destruction. As we are standing on our feet". A viu novamente somente no elevador daquele prédio. Estava indo almoçar e acabara convidando-o para fazer companhia. Iniciaram uma grande amizade então. "So since you want to be with me. You'll have to follow through. With every word you say. And I, all I really want is you. For you to stick around.I'll see you everyday. But you have to follow through". Descobriu que namorava, não teve coragem de dizer que era louco por ela. Mesmo quando esta terminou, não disse. Tinha pavor da rejeição. A amava, com toda a alma e coração. Queria-a, desejava-a. "You have to follow through". Um dia estavam em sua casa. Sentados na cama, discutiam sobre a atuação de uma personagem de algum filme. Riam horrores dos absurdos que diziam. Numa crise de riso, ela caíra da cama e ele tentando segurá-la acabara caindo junto com ela. No chão riam ainda mais. Parando a graça olharam um ao outro de uma maneira diferente. Os corações palpitavam, não conseguiam desviar um do outro ou fazer qualquer coisa. A porta abriu e seu pai aparecera perguntando o que ambos estavam fazendo no chão. Em um segundo levantaram e nunca mais ficaram daquele jeito. "These reeling emotions they just keep me alive.They keep me in tune.Oh, look what I'm holding here in my fire. This is for you." Sua carência era absurda. Qualquer briga já o chamava e ele ficava um tempão abraçando-a. Era inteligente e contrariava o pai que a queria como advogada. Fez arquitetura. Sorria de tudo e para todos. Apesar de sua simpatia, era difícil conquistar sua confiança. "Am I too obvious to preach it? You're so hypnotic on my heart". Sua cor preferida era vermelho, mas nas roupas usava cores neutras como branco e preto. Só calçava sapatos com salto à noite e em festas. Raramente o usava em outro lugar. Maquiagem só o necessário. Ficava linda naturalmente. O cabelo sempre liso, bem cuidado e comprido. Amava música, dançava sozinha se deixasse. Cantava também. Não muito bem, mas cantava. Amava a Itália, sua comida, história, cultura. Moraria lá um dia, dizia. "So since you want to be with me. You'll have to follow through. With every word you say. And I, all I really want is you. For you to stick around. I'll see you everyday. But you have to follow through. You have to follow through." Brigaram algumas vezes, inclusive por ciúmes. Ela implicava horrores com as namoradas que ele arrumava. Sempre arrumando defeitos, muitas não eram boas o suficiente. Muitas vezes ela estava certa, mas ele insistia num relacionamento a qualquer custo. Queria amar outra mulher, mas não conseguia. "The words you say to me are unlike anything. That's ever been said. And what you do to me is unlike anything. That's ever been." Amava sua voz irritante quando discutia. "Am I too obvious to preach it. You're so hypnotic on my heart". Amava sua cara manhosa quando brigava com o pai e corria à ele. "So since you want to be with me. You'll have to follow through. With every word you say." Amava seu sorriso largo com dentes perfeitos. "And I, all I really want is you. For you to stick around. I'll see you everyday." Amava a confiança que tinham um no outro acima de qualquer coisa. "So since you want to be with me. You'll have to follow through. With every word you say." Amava tudo, simplesmente qualquer coisa naquele garota simples e complicada, amavél e ignorante. "And I, all I really want is you. For you to stick around. I'll see you everyday." Tirou o microfone do apoio e desceu as escadas lentamente em direção a primeira mesa. Tomara coragem, depois de tempos sem. Precisava falar, não aguentava mais. Seus olhos enchiam de lágrimas, mas não chorava. Tinha que dizer, afinal. "But you have to follow through. You have to follow through. You're gonna have to follow." Parou em frente a garota e segurando em suas mãos terminou a música. "Oh, this is the start of something good. Don't you agree?". Sorrindo e enchendo o peito com toda a emoção do mundo virou para a mulher que amava e disse fora do microfone "Eu te amo, fica comigo?". Junto com os aplausos das pessoas, a ouviu dizem sim e sem pensar duas vezes a entrelaçou em seus braços e a beijou com toda a vontade.


As músicas presentes são Halo da Beyoncé e Follow Through do Gavin Degraw

9 de jun. de 2010

Vozes eternas

Passava pelo corredor vazio, era começo da noite. Estava com pressa para chegar em casa. O dia havia sido longo, cansativo. Estivera naquele prédio desde às oito da manhã, não queria sentir nem o cheiro dele agora. Agora, voltava da biblioteca. Alugara um livro, um romance épico. Iria lê-lo no fim de semana, não estava com vontade de ir a qualquer lugar nos próximos dias. Ficaria o dia inteiro na cama lendo, imaginando e depois colocaria tudo isso no trabalho mês que vem. O professor havia de ficar satisfeito, pensou. Parou, de repente, em frente a porta da antiga sala de música no corredor. Ouviu um piano e uma música conhecida por ela. Esqueceu do cansaço e ficou ouvindo a voz maravilhosa. "Well it kind of hurts when the kind of words you write. Kind of turn themselves into knives. And don't mind my nerve you can call it fiction. ‘Cause I like being submerged in your contradictions dear. ‘Cause here we are, here we are." Paralisada ao som, não sabia se abria ou não a porta. Queria ver quem cantava a música, queria conhecer o dono dessa bela voz. Tomando coragem, abriu a porta. Vendo na sala, um jovem ao piano, cabelos loiros, pele branca. De costas, somente via parte da camiseta branca e da calça jeans preta. "Your comebacks they’re quick. And probably have to do with your insecurities. There’s no shame in being crazy, depending on how you take these. Words that paraphrasing this relationship we’re staging." Continuou cantando não percebendo a presença da jovem observando-o. Quase todos os dias antes de voltar para casa, ia aquela sala que descobrira dois anos antes e tocava. Ninguém aparecia ali depois que abrira a outra sala de música no andar de cima, então ficava tocando naquele lugar durante um tempo. Adorava isso, deixava sua voz soltar. Nunca havia sido notado, até agora. A mulher parada a porta contemplava o homem. Queria sentar ao seu lado e cantar junto, mas não permitia-se essa intromissão. Afinal, sua voz era maravilhosa demais para ser interrompida. Imaginou o que ele fazia, qual faculdade frequentava naquele Campus. Pensou que fosse música, mas poderia ser outra. Queria perguntar seu nome, se tinha namorada, onde morava, do que gostava. Sua curiosidade crescia a cada verso cantado. "And through timeless words in priceless pictures. We’ll fly like birds not of this earth. And tides they turn and hearts disfigure. But that’s no concern when we’re wounded together." Quase no fim da música, seu coração batia desesperadamente. A emoção dominava-a. Conhecia a música, somente não se apaixonara tão intensamente como agora. Ou era pela voz que estava se apaixonando? Ou era pelo homem que a cantava? Não sabia, mas não ousava mover o pé dali. "And we tore our dresses and stained our shirts. But it’s nice today, oh the wait was so worth it." Terminado de tocar, o jovem olhou para trás. Tivera uma sensação estranha durante a música, sentia que alguém o observava. Agora, olhando para trás não via ninguém. Provavelmente era algo da sua imaginação. Somente sabia que não cantava dessa maneira há muito tempo. Cantara com a alma, com a emoção, com o coração. Estava radiante. Saindo da sala, pensou que poderia voltar a tocar ali no outro dia. Talvez conseguisse cantar daquela maneira como cantara. De novo.

(A música do texto é "A beautiful mess" do Jason Mraz)

4 de jun. de 2010

O mundo em algum medo


Correu para as escadas sem olhar para trás. Não sentia mais o corpo, somente o desejo de fugir dali. O medo dominando-a. Desceu as escadas rapidamente, pulando vários degraus ao mesmo tempo. Podia senti-lo ali, sua respiração parecia ainda correr pelo seu pescoço. Abriu a porta do térreo. Estava vazio, mas mesmo assim ficou com receio de sair. E se ele aparecesse? Não poderia vê-lo novamente, não conseguiria fugir. Decidiu arriscar e saiu correndo rumo a saída. No meio do caminho olhou para trás e o viu. O olhar penetrava no dela. Sorriu de uma maneira que a fez entender que ele iria atrás dela. Não descansaria até tê-la nos braços e fazer todas as coisas que sonhara. Por ora, saiu correndo rumo a grande avenida movimentada. Pensou em ir direto a policia, mas sabia que não adiantaria. Seu marido tinha grande poder de persuasão, provavelmente convenceria os policias que ela era louca. Depois de uns vinte minutos parou de correr, sentiu agora todas as dores que antes não sentira. Mas o medo ainda corria pela suas veias, o medo apavorava, consumia. Olhou para os lados, vendo inúmeras pessoas que não prestavam atenção. Não sabiam do perigo que a mulher de olhos negros estava sofrendo. Queria fugir. Queria voar como um pássaro e ir para qualquer lugar. Longe dele. Pensou na família, pensou em como ela o havia conhecido. Era elegante e charmoso, logo a conquistara e a pedira em casamento. Tonta, aceitara de imediato. Nem o conhecia direito, estava cega de paixão. Havia, somente, dois meses que casara e sentia que estava presa a ele a vida inteira. Entrou no banco, sem pensar muita coisa tirou boa parte da quantia que possuía. Tiraria o resto quando chegasse ao destino. Entrou no metrô, em direção a rodoviária. Ia embora, mudaria de nome, largaria tudo. Mais tarde, mandaria um e-mail para sua mãe, contando-lhe que estava bem. Não voltaria a pisar naquela cidade, nunca nem o veria.

2 de jun. de 2010

Um passado distante

Abriu os olhos no mesmo horário de ontem, seu despertador interno nunca errava. As sete e meia da manhã despertara, levantando-se preguiçosamente até o banheiro. Antes reparou no calendário em cima da escrivaninha. 28 de Fevereiro. Não reparara que já haviam passado dois meses do Natal. Lembrou-se, de repente, dos natais de sua infância. Seu pai sempre o levava para a casa de seus avós em Nova Iorque, ficava admirado com a neve e a quantidade de luzes dessa época. Nesse tempo queria ser escritor, adorava ler romances antigos como "O morro dos ventos uivantes". Passava horas com um livro nas mãos, lendo, relendo e imaginando. Se identificava com as personagens e muitas vezes se colocava na história. Era mágico! Mas com o tempo perdeu essa magia, principalmente quando os pais morreram em um acidente e deixara uma empresa para cuidar. Não podia decepcionar o pai, então não abandonara a empresa. 10 anos depois estava ele ali, trabalhando muito. Fez projetos novos, mudou muita coisa e colocara a empresa com a sua cara, mas mesmo assim, não conseguia sentir o mesmo amor que sentia pela literatura quando criança. Sentou na mesa de café da manhã, logo a empregada trazendo um copo de café quente. Reparou na aparência tristonha da mulher e perguntou-lhe gentilmente o que havia acontecido. Surpreendeu-se quando ela começou a chorar e dizer que o marido havia fugido com uma amante. Sentiu dó e a mandou para casa, tendo o dia de folga. No caminho para o trabalho pensou na pobre senhora e imaginara com quem o infeliz fugira. Era uma mulher bondosa e honesta. Como poderiam largá-la de repente? Por isso, nunca casara. Não queria viver com uma pessoa por obrigação, ser um farto para ela. Sempre estivera ocupado demais, não poderia ser um bom marido. À noite se sentiu sozinho. Sentia saudades de sua família, queria alguém para estar junto. Pedir ajuda quando precisar. De novo, sentiu pena da empregada. Agora ficaria sozinha com dois filhos adolescentes. Sentiria ele falta dela? Provavelmente não. Fechou os olhos, tentando dormir. Imagens da infância, do pai, da mãe e dos avós não paravam de passar pela sua cabeça.